Carlos Neto, Professor Catedrático e Investigador, Luís Arrais, Presidente da Federação de Ginástica de Portugal e Paulo Oom, Médico Pediátrico formaram o painel de luxo que inaugurou o primeiro programa de 2021 da rubrica “CDP Entrevista…”, sob o tema – O Desporto e as Crianças.
«Estamos a viver um período de analfabetismo motor», defendeu Carlos Neto, um dos maiores especialistas mundiais na área da brincadeira, que considera que as crianças já estavam confinadas mesmo antes da pandemia. De acordo com o professor, o número de horas que as crianças passam sentadas, e a falta de liberdade que têm em brincar, principalmente na rua, leva à ausência de atividade física, que se reflete não apenas, em problemas cardiovasculares e de obesidade infantil, como também, nas relações emocionais e sociais com as outras crianças.
Paulo Oom, médico pediátrico, acredita que, o excesso de sedentarismo pode ser evitado se os pais tivessem mais tempo para os filhos. «Os pais dizem às crianças para comerem saladas enquanto eles comem batatas fritas». De acordo com o diretor do departamento de pediatria no Hospital Beatriz Ângelo, em Loures, os filhos são o reflexo do exemplo dos pais, e nessa perspetiva, acredita que é necessário que seja a família a dar o primeiro passo, e mudar os hábitos em prol do bem-estar das crianças.
Luís Arrais, Presidente da Federação de Ginástica, confessou, que infelizmente, nos dias que correm, são muitas as crianças que ainda não sabem correr, nem mesmo saltar. Um cenário negro defendido pelo também professor de educação física, que acredita que muitas crianças que acabam por desistir do desporto, fazem-no por não se sentirem preparadas ou pela falta das capacidades básicas exigidas a uma criança, quando a infância, fala por si.
Professor catedrático na Faculdade de Motricidade Humana (FMH) da Universidade de Lisboa (UL), Carlos Neto, defendeu que «as crianças hoje em dia, estão dependentes das agendas dos adultos». Para o especialista, os pais tornaram-se protetores demais, e esqueceram-se que é fundamental que uma criança possa subir a uma árvore, ou simplesmente correr na rua, ter contato com a natureza, para que possa correr riscos e ganhar autonomia, como o simples facto de ir a pé para a escola, por exemplo. Com a pandemia e a ausência do desporto escolar, acredita que «o corpo ficou esquecido. Só se pensa na escola para entrar para a faculdade». No debate, Carlos Neto frisou ainda que, «corpos ativos dão cérebros ativos».
Uma abordagem certeira e que preocupa Paulo Oom, ao descrever o que a falta de relação e partilha de vivências com outras crianças, a aliar à insegurança dos pais em como educar os filhos, pode afetar o futuro de uma criança em termos físicos, emocionais e sociais. «Muitos pais vão à consulta de pediatria e a criança não vai». Esta intervenção de Paulo Oom é uma chamada de atenção para o mundo em que vivemos, onde já não se procura tanto o médico para tratar de um joelho ferido ou de uma simples dor de ouvidos, mas sim, para perceber, num era cada vez mais digital, e sem o toque pessoal que a pandemia roubou, como se deve lidar e educar as crianças.
Sobre a importância das cidades atuais na dicotomia do desporto com as crianças, Carlos Neto defendeu que o desporto deve ser reinventado. Para o professor, é fundamental que se forme um pacto de sustentabilidade entre as famílias, as escolas e a comunidade. «Os portugueses têm um ADN aventureiro, mas que está anestesiado».
Já Paulo Oom defende a ideia de que brincar reforça a imunidade, no entanto, não se pode pensar só no físico. «O comportamento da criança em questão de autonomia e fairplay com os outros é fundamental».
A mesma linha de pensamento foi partilhada por Luís Arrais, ao argumentar que é «pela atividade física que temos que ir lá. As crianças precisam mover-se e sair de casa. O desporto virá depois».
O papel do desporto na vida ativa das crianças inaugurou deste modo uma panóplia de debates da rubrica “CDP Entrevista”, cujas sessões quinzenais vão manter-se às terças-feiras, mas às 21h, com transmissão em direto no Facebook da Confederação do Desporto de Portugal.
Fonte: 10/02/2021
CONFEDERAÇÃO DO DESPORTO DE PORTUGAL